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Uma igreja confessional

A Igreja Presbiteriana do Brasil é uma igreja confessional, tendo adotado como símbolos de fé os padrões doutrinários de Westminster. Mas o que isso representa para uma denominação e para cada oficial em particular? É o que analisa o reverendo Williamson neste artigo.

Os votos dos membros

Isso não significa que todo membro comungante da igreja seja obrigado a aceitar essas fórmulas desde o primeiro dia. Isso deveria ser por si só evidente no fato de que os filhos dos crentes são recebidos como membros da igreja por meio do batismo. Eles começam, em outras palavras, como bebês em Cristo, bem como bebês nos braços.

Mas a igreja também recebe com alegria os bebês em Cristo de outro modo. Ela acolhe aqueles que, como o carcereiro de Filipos mencionado em Atos 16, estão apenas começando a entender o pleno conselho de Deus, mas que fornecem evidências suficientes de uma submissão de coração à autoridade da Palavra de Deus e – subordinado a isso – aos oficiais que Cristo colocou na Igreja para ensiná-los. Exigir que essas pessoas esperem até que tenham instrução suficiente para aceitar os Padrões de Westminster como um todo, seria um sério desvio do modelo apostólico.

Afinal de contas, qual é a tarefa do ministro? Não é equipar os santos para o trabalho do ministério e “para a edificação do corpo de Cristo, até que todos cheguemos à unidade da fé e do pleno conhecimento do Filho de Deus” (Ef 4.13), de modo que – por fim – nós “não sejamos mais como meninos agitados de um lado para o outro e levados ao redor por todo vento de doutrina” (v.14)? Porventura, disso não fica claro que exigir uma subscrição a uma confissão tão elaborada da doutrina cristã, como temos nos Padrões Westminster, vai muito além da capacidade de muitos novos convertidos a Cristo? E não é igualmente claro que os inspirados apóstolos não deixaram esse fato excluir aqueles que deram evidência digna de crédito de fé no Salvador?

Estou convicto de que, nisso, a nossa igreja se qualifica entre as Igrejas Reformadas mais fiéis, e espero que ela continue assim. Que o Senhor continue a separar muitas pessoas desta geração perdida por meio do seu testemunho fiel, e que ele possa, então, continuar a fazer uma grande obra de edificá-las em fé e obediência por meio do ministério de ensino das nossas igrejas.

Essa é a razão por que a nossa igreja faz uma distinção entre os votos relativamente simples que os adultos convertidos fazem quando eles são recebidos como membros da igreja, dos votos mais elaborados que são exigidos dos homens em nosso meio que são ordenados.

Isso não significa que os dois estejam em conflito. De modo nenhum, pois se aqueles que fizeram os votos de membros forem fiéis em os mantiverem – enquanto crescem na graça e no conhecimento do Senhor –, eles chegam à fé madura que está tão plena e maravilhosamente expressa nos nossos Padrões. A razão é óbvia: a fé resumida nos Padrões de Westminster é a fé ensinada na Bíblia. Assim, qualquer pessoa que sinceramente se submeta à autoridade da Bíblia será capaz, no final, de dizer a respeito desses padrões o mesmo que um oficial diz, ou seja: “Aqui está um sistema de doutrina que é ensinado nas Escrituras”.

Os votos de ordenação

É importante observar, entretanto, que mesmo então – mesmo quando nós, como oficiais, aderimos aos Padrões de Westminster –, nós não os colocamos no mesmo nível da Bíblia. Um dos artigos mais importantes da nossa fé é que somente a Bíblia é infalível. Mesmo os melhores escritos de homens (e isso é, afinal de contas, o que são os Padrões de Westminster) são falíveis. E é por essa razão que a igreja jamais constrange a consciência dos seus pastores, presbíteros e diáconos para que concordem de modo absoluto com a redação desses documentos.

Porventura existe algum pastor, presbítero ou diácono, que em alguma ocasião não tenha discordado de, no mínimo, algum palavreado desses documentos?[1] Também é um fato que a igreja, ao longo de toda a sua história, tem desejado dar espaço aos homens para discussão consciente de aspectos específicos das formulações contidas nesses Padrões. E estou convicto de que nossa igreja mostra sabedoria em agir assim.

Mas justamente nesse ponto é que todos nós, que fizemos os votos de ordenação, devemos exercer grande cuidado a fim de não abusar desse privilégio de dissensão consciente.

Tomemos como exemplo o ensinamento dos Padrões de Westminster relativo ao sábado. Pode um homem servir como oficial se ele não estiver persuadido de que a própria Bíblia ensina uma concepção tão severa da aplicação atual do quarto mandamento conforme nós encontramos nesses Padrões? A resposta é que ele pode, e esta não é minha opinião pessoal apenas. É um fato bem conhecido. Concílios e Presbitérios têm ordenado e instalado homens que têm honestamente expressado reservas com relação à formulação de Westminster com respeito ao sábado.

E o propósito deste artigo não é discordar dessa concessão. Mas eu não concordo com o passo além que alguns têm dado. Eu me refiro aqui à pregação pública, aos ensinamentos ou aos escritos – e à prática pessoal – de oficiais da igreja que contradizem os nossos Padrões oficiais. Estou convencido de que isso, com efeito se não com intenção, mina a integridade confessional da nossa denominação.

Integridade pessoal é essencial

Para alguns isso pode soar como uma restrição severa. Mas é minha convicção de que é apenas na medida em que cada um de nós esteja disposto a arcar com o ônus do respeito autoimposto pelos nossos documentos confessionais, que nós podemos permanecer numa Igreja Confessional. O que estou dizendo, em outras palavras, é que em todo meu ensinamento oficial e minha prática pessoal, eu devo buscar sinceramente estar em harmonia com os Padrões de Westminster. Dessa maneira eu contribuo para a unidade e paz da igreja.

E deixe-me acrescentar que não há razão para considerar isso um peso intolerável. De jeito nenhum, porque existe para mim um caminho aberto para efetuar mudanças nos padrões oficiais da igreja se essa restrição autoimposta se tornar uma carga grande demais para suportar. Não é fácil, naturalmente, ir ao Concílio, ao Presbitério ou à Supremo Concílio com argumentos bíblicos fortes o suficiente para persuadir outros de que eu estou certo e os Padrões de Westminster estão errados. Isso requer um volume enorme de trabalho árduo.

E é obviamente bem mais fácil – e aqui reside a tentação –, de apenas ignorar os Padrões oficiais da igreja pelo ensinamento unilateral e pela prática. Mas o caminho difícil é o caminho certo. Na verdade, minha convicção é que se trata do único caminho que consoante com nossa subscrição.[2] Imagine o que a igreja logo se tornaria se cada homem fizesse o que é reto aos próprios olhos! No entanto, isso é o que começa a acontecer quando nós escolhemos ignorar – ou mesmo contradizer – os credos oficiais da nossa igreja na pregação pública, no ensino e nas ações.

Em tudo isso nós devemos nos lembrar, mais uma vez, que não existe nada que impedirá a igreja de cair, se nós, que somos os oficiais, não tivermos integridade pessoal. Nem mesmo o maior credo jamais escrito poderá garantir a fidelidade perene de uma igreja. Não é essa uma das lições patentes da atualidade? Grandes igrejas Reformadas têm caído na destruição espiritual apesar do fato de terem credos elaborados e rigor quanto à membresia e votos de ordenação.

A igreja tem sido sábia, na minha opinião, em não buscar preservar a sua ortodoxia por meio de uma forma excessivamente severa de subscrição. Mas não há espaço para complacência. “Aquele, pois, que pensa estar em pé veja que não caia” (1Co 10.12). E, “se alguém julga ser alguma coisa, não sendo nada, a si mesmo se engana. Mas prove cada um o seu labor e, então, terá motivo de gloriar-se unicamente em si e não em outro. Porque cada um levará o seu próprio fardo” (Gl 6.3-5).

Texto extraído da revista Servos Ordenados, nº 2. Adaptado com permissão de Ordained Servant, vol. 5, nº 1 (janeiro, 1996). G. I. Williamson é editor da revista.


[1] Eu tenho o Breve Catecismo de Westminster na mais alta estima. Mas gostaria que os autores nunca tivessem caracterizado a Palavra de Deus como “que se acha” nas Escrituras do Antigo e do Novo Testamento! A Assembleia de Westminster não previu a maneira como esse termo poderia – não por causa do aparecimento do erro neo-ortodoxo – se tornar tão ambíguo. Eu não discordo com o que os autores desse catecismo disseram, mas lamento o modo como o disseram.

[2] O sexto voto de ordenação para ministros da IPB traz o seguinte: “Prometeis manter zelosa e fielmente as verdades do Evangelho, a pureza e a paz da Igreja, seja qual for a perseguição e oposição que contra vós se levante por este motivo” (Manual do Culto, Perguntas Constitucionais, pergunta nº. 6).

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